O líder da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, diz que as estimativas do seu partido apontam que há mais de 2,5 milhões de mortos nas listas eleitorais do país. Não é novidade. Tal como não é novidade que muitos deles “vão” votar no MPLA. Como noutras eleições, em muitos locais as votações foram de 100%, incluindo… mortos.
O ficheiro eleitoral entregue à Comissão Nacional Eleitoral tem um número superior de eleitores ao ficheiro provisório do qual deveriam ser expurgados “os mortos, os transitados em julgado e os que tiverem comprovadamente alguma doença”, de acordo com o director do registo eleitoral oficioso do Ministério da Administração do Território, Fernando Paixão.
Dados até provisórios continham 14 milhões de cidadãos e na passada segunda-feira o MAT entregou o ficheiro de cidadãos maiores à CNE, com 14.390.091, ou seja um número superior ao dos dados provisórios.
Isto deixou indignado os membros dos partidos políticos com assento parlamentar, manifestado pelo presidente da UNITA, Adalberto da Costa Júnior. “Foi-nos informado que desde 1996 que não se faz a depuração de cidadãos falecidos das listas e que a média de mortes por ano era de 100 mil”, disse.
“Ora, de 1996 a 2022 passaram 26 anos, feitas as contas são dois milhões e seiscentos mil mortos que não saíram das listas”, afirmou Adalberto da Costa Júnior.
O demógrafo João Lukombo Nza Tuzola diz que “o governo tem que explicar como é que esse dado definitivo não é diferente do provisório, sabendo que foram retirados publicamente um número de mortos que veio nas páginas do Jornal de Angola”, órgão oficial do Governo/MPLA.
Por sua vez o jurista Adriano Kulimbala diz que com esses dados fica provado que há falta de transparência e lisura nas eleições gerais.
“São essas manobras que levam o partido no poder a encontrar espaços para se perpetuar no poder, recorrendo à fraude, isto faz-nos afirmar que em Angola até os mortos votam”, disse.
Convém não esquecer, fazendo fé na “lei” do MPLA já bem testada nas eleições anteriores, que podem haver excepções e os mortos votarem desde que, é claro, deleguem essa missão em dirigentes eleitorais do MPLA. É desta “lei” que resulta o facto de haver casos em que surgiram mais votos do que eleitores inscritos.
“São circunstâncias naturais e outras decorrentes da lei que não estão sob nosso controlo por que tem de haver uma data de corte” para a ficheiro informático que deu entrada no Tribunal Constitucional.
Até ver, o MPLA tem garantias de que a máquina eleitoral está quase pronta. Todos os dias se verifica que, tal como no tempo de José Eduardo dos Santos, filho de jacaré é jacaré. Ao contrário do que afirmou, o Presidente João Lourenço mostrou que não há jacarés vegetarianos.
Os angolanos começam a ver que o MPLA não é (nunca foi) uma solução para o problema. É, isso sim, um problema para a solução. Não admira, por isso, que João Lourenço tenha dado sobejos sinais de que não irá perder tempo com julgamentos nem com eleições cujos resultados não controlasse. Agostinho Neto já o fizera com total sucesso. O MPLA já admite em público que a vitória será sempre certa.
A maioria da oposição parlamentar, com a qual o MPLA está a ficar farto porque ela vai mostrando que o partido de João Lourenço só consegue viver em guerra ou num sistema de único partido, considera que o MPLA usa todos os subterfúgios possíveis para esconder a falta de vontade política do partido no poder para dar a palavra (e o direito livre de escolha) ao Povo.
Com efeito, o secretário para os Assuntos Eleitorais do MPLA afirmou há uns meses que não havia, de momento, “condições objectivas” para levar o escrutínio avante, no meio da pandemia de Covid-19. Referia-se às autárquicas, mas a estratégia aplica-se a tudo o que o MPLA quiser.
Recorde-se que, em declarações à Rádio Nacional, Mário Pinto de Andrade sustentou que a experiência dos países da África Austral que realizaram eleições legislativas foi “muito má”, o que exige muita cautela. De facto, é complicado. Como é que o MPLA poderá aceitar ser derrotado pelo seu adversários histórico (que considera desde sempre ser inimigo), a UNITA? A democracia “made in MPLA” baseia-se na tese de que – tal como no partido – nas eleições no país só devem votar os militantes do MPLA.
“Aliás, nós temos estado, ao nível do MPLA e dos partidos da oposição, a participar (em encontros) online de outros países aqui da África Austral que realizaram eleições legislativas, e em que as pessoas pedem-nos para termos cautela porque a experiência deles foi, de facto, muito má”, sublinhou Pinto de Andrade.
E tem razão. Como sempre o MPLA tem razão. Porque o MPLA é Angola e Angola é do MPLA, não há razões para respeitar a democracia (que, ainda por cima, como disse Eduardo dos Santos, “nos foi imposta”). Além do mais, as eleições custam muito dinheiro que, na verdade, faz falta para ajudar os dirigentes do MPLA a comprarem mais casas, empresas etc. no estrangeiro.
Na verdade, hoje o MPLA tem medo. Mas não há razões para isso. Bem que o partido de João Lourenço poderia até divulgar agora os resultados das próximas eleições…
Folha 8 com VoA